quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

Morte natural

“Essa morte constante das coisas é o que mais dói.”

[Caio F. Abreu - ]

Toda a pessoa que é espiritualizada, seja qual for sua religião, tem a crença na continuidade da vida após o desiderato natural do corpo físico. Alguns não só acreditam como têm certeza desse fato. Sou um deles.

Claro, existem aqueles que duvidam disso ou até mesmo titubeiam em sua crença. Vivem normalmente, mas quando o momento infaltável chega ou se afigura próximo a dor é muito intensa e atroz o sofrimento.

Já com aqueles que têm certeza de que a vida continuará isso não se dá. Não há medo da perda da vida simplesmente porque ela não cessará. Não existe morte, existe apenas um ponto de mudança que consideramos drástico. Hora estamos aqui, hora estamos “lá”. Sem medo de mudanças desse tipo, não há horror e nem terror.

Como é bom viver tranqüilo quanto a isso, não?

...

Lendo o trecho de Caio F. logo acima, compreendi que ele falava dessa desilusão contínua em que tudo se transforma. Todo o gosto das primeiras impressões se vai indo. Leva pouco tempo, até. E, como ele mesmo diz, “restaram o frio e a umidade que amolecem papéis e vontades..." e, daqui, caímos no ostracismo de nós mesmos. Quando essa desilusão já foi vivida ela constrói um castelo de espinhos em torno de nossas limitações. Essas limitações sempre estão escondidas e não se fazem presentes nas primeiras visitas. Elas se vão mostrando aos poucos e ferindo o trato epitelial somente pela superfície; isso é o bastante para afugentar.

Mas existem aqueles que insistem e acabam indo residir no referido castelo e dentro de poucas primaveras sentem a dor lancinante das espadas cactuais que se encravam por além da pele e atingem o interior do que se é. Acabam por se evadirem de si para conseguir sair do castelo.

Há outro – louco – que, após as lanças o terem rasgado até mesmo nas cicatrizes que se formavam, enraíza-se nos porões e nas masmorras não se importando com essa pequena parte úmida e desconhecida do todo. A esse é garantido o direito de respirar os ares que só do terraço se podem tocar. A esse é assegurada a totalidade do estar-ser. Logicamente esse castelo não está, em nenhuma hipótese, sem um proprietário. Esse proprietário faz jus ao que é e não deixará que um outro fique a se valer de uma liberdade total aqui. Vezenquando virá e torcerá as escadas, modificará a colocação dos espinhos, inventará novos caminhos simplesmente para pôr a prova esse possível simbionte. E isso não o deixa se tornar um simbionte.

...

Eu tinha medo dessa morte constante das coisas... agora que vi que são apenas mudanças, não as temo mais... Frio na barriga? Claro que sim! Afinal, imagine ver escadas mudando de lugar justo no momento em que as tentamos subir ou então corredores que sempre estiveram ali que mudam de posição e parecem conduzir a outro caminho?

Viva! Viva! Viva! a morte constante das coisas!

2 comentários:

Anônimo disse...

Tá, ok. Eu estou ciente de que vou parecer uma louca dizendo isso, mas tenta pegar a linha-base de raciocínio.
Vou pegar como exemplo uma flor. Uma flor só murcha quando conseguiu tirar até o último alimento daquela terra em que foi plantada.Terra ruim, ela secar mais rápido. Terra boa, ela vai durar mais. Mas independentemente do tempo [que existe mais na mente do que no universo], elas tiram o que tem p'ra tirar do solo em que foram colocadas.
Assim são os parâmetros, assim é tudo na vida. As coisas, as pessoas, as gerações, os padrões... Eles sugam o que precisam e devem dar espaço à outros,como um crescimento constante. Tudo precisa renovar-se, até nos mesmos.
Por isso eu repito contigo esse 'viva a morte constante das coisas', porque sei que é uma necessidade.
Beijos

Anônimo disse...

Limitados somos todos nós, sim.
Mas se todos pensarmos que não podemos 'vetar' aos poucos os defeitos por os termos também, nada jamais será modificado, né?


Hasta